AS PEÚGAS DE EINSTEIN


Acostumado às interpretações autorais, quase sempre pautadas pela experimentação, o grupo Bagaceira, por um breve momento, se permitiu seguir novos caminhos criativos. O motivo? Um texto escrito especialmente para o coletivo cearense pelo dramaturgo e diretor português Helder Costa, da companhia A Barraca, uma das mais tradicionais de Portugal. ``Não queria mexer muito na proposta, fiz um desenho de cena bem corretinho. Eu devia ter apostado mais, fiquei pensando depois, como a gente costuma fazer``, anuncia Yuri Yamamoto, que recebeu com empolgação o convite para a assistência de direção e, com o texto em mãos desde setembro, preparou o terreno com seu grupo, esperando a vinda do diretor português. A chegada de Helder ao Ceará, para a direção do Bagaceira, desconstruiu todas as ideias amarradas à interpretação convencional e, para a surpresa do elenco, aproximou-se da linguagem que o Bagaceira costuma levar aos palcos.

As Peúgas de Einstein é o espetáculo que nasce dessa parceria Ceará/Lisboa. A proposta surge da cabeça inquieta da veterana atriz e produtora Fernanda Quinderé, motivada pelas comemorações dos 90 anos da experiência que provou a validade da teoria de Einstein sobre a relatividade e os dez anos da fundação do Museu do Eclipse em Sobral. E tanto Helder Costa quanto o Bagaceira aceitaram de pronto.

As apresentações estão marcadas para sábado, 7, e domingo, 8, no Teatro São José, em Sobral, e ainda nos dias 10 (terça) e 11 (quarta), no teatro do Centro Dragão do Mar. ``É um trabalho completamente novo para o Bagaceira. É uma proposta de dramaturgia que ainda não tínhamos trabalhando, com um texto histórico. Ao mesmo tempo, tem temperos de absurdo, o que aproxima da nossa linguagem``, analisa o ator e dramaturgo Rafael Martins.

Helder construiu Albert Einstein na sua dimensão humana: homem, cidadão, cientista, judeu. ``Einstein foi um cientista-astro. Alguém que era reconhecido nas ruas, tamanho foi seu feito. Não estamos a fazer uma peça nada convencional. Há uma brincadeira com a temporalidade, com as ações. Porque teatro deve ser sucinto, atrativo, deve ter humor para, depois de trabalhar tudo isso, ser político``, define o diretor que, antes de começar o trabalho em conjunto, assistiu ao espetáculo Tá Namorando! Tá Namorando! para conhecer melhor o Bagaceira. ``Um trabalho lindo, muito correto, foi um alívio ver o quanto eles eram bons (rindo). A maior dificuldade foi de eles me entenderem``, brinca. Por conta das diferenças entre os usos da língua no Brasil e em Portugal, juntos, diretor e grupo, realizaram pequenas adequações no texto.

Rogério Mesquita, ator que interpreta o protagonista do espetáculo, afirma que o fato de Helder fazer parte de um teatro de grupo abriu as possibilidades para um trabalho bem mais participativo. ``Não buscamos um método, procuramos um homem em suas várias facetas, em suas ideias, posicionamentos, cultura. Uma construção que ainda continua``, diz o ator.

O espetáculo começa exatamente no momento da encenação. É Einstein chegando a Sobral para as comemorações das nove décadas da comprovação da Teoria da Relatividade. O tempo é atualizado, o cotidiano do século XXI percorre a vida de um homem completamente político, envolto em questionamentos sobre a coletividade. Misturada a isso, as minúcias do cotidiano de um homem galanteador.

No caminho, há o encontro com amigos, em particular Charlie Chaplin, também ativista contra Hitler, e a perseguição do MacCarthysmo. Segundo Helder, permanece a coerência de luta. Einstein sempre disse que a verdadeira crise é a crise da incompetência e a tragédia consiste em não querer lutar para superar. As coisas que menos ambicionava, porém, o perseguiam: fama, dinheiro, sucesso, poder. Tímido, certa vez, disse a uma escritora: ``Quer que lhe diga um segredo? Não uso peúgas``, revelando calçar sapatos sem meias.

Através do humor e da informação da História do seu tempo, Einstein surge como um cientista com valores humanistas e progressistas, ativista contra a fome, a miséria e a opressão, longe do intelectual encerrado na sua torre de marfim. ``Em um dado momento, ele chega numa taberna e começa a falar sobre física quântica, sobre suas teorias. Porque ele quer explicar ao público, quer ser acessível``, finaliza Helder.

SERVIÇO

AS PEÚGAS DE EINSTEIN - peça com direção de Helder Costa, com o Grupo Bagaceira de Teatro. Produção e figurino: Fernanda Quinderé. Dias 7 e 8, no Teatro São José, em Sobral, às 19 horas e dias 10 e 11, no teatro do Dragão do Mar. Gratuito. Outras informações: (11) 3611 2956 (Secult Sobral) e (85) 3488 8600 (Centro Dragão do Mar).

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